Criado em Salvador no segundo semestre de 1990 por iniciativa do diretor Márcio Meirelles e em parceria com a agremiação Olodum, o Bando de Teatro Olodum vem se destacando na cena brasileira por colocar em prática um complexo projeto poético-político que inclui representar o cotidiano da população negra, combater o racismo, valorizar e divulgar a cultura negra no país, contribuir para a presença ativa do negro na sociedade, promover a conscientização e a construção das identidades negras, capacitar artistas negros, desenvolver dramaturgia e linguagem cênica própria. O nome já indica o caráter combativo e afirmativo do grupo: a palavra “bando” designava a reunião de africanos escravizados com o objetivo de organizar a fuga para o quilombo, já “olodum” veio de empréstimo do bloco carnavalesco de resistência negra.
A companhia tem por influência a cultura negra baiana, absorvendo dela a religiosidade, o caráter festivo e popular, a dança, os ritmos, os instrumentos percussivos, a memória ancestral, a estética corporal, as formas de resistência, a ênfase no registro oral da língua. Todos esses aspectos são elaborados artisticamente, resultando em uma estética engajada de cunho racial que flerta com o humor e a ironia (por vezes, corrosiva) para debater temas caros à comunidade negra: a violência institucional, a discriminação, as desigualdades sociais, as violações de direitos fundamentais. Para transformar esse complexo material em um modo de expressão único, o Bando investe em treinamento semanal - mesmo quando não está em cartaz ou em processo de criação - nas áreas de canto, dança, iniciação musical e interpretação.
O processo colaborativo foi a forma encontrada pelo grupo para enriquecer a criação artística, de modo a favorecer a diversidade de perspectivas sobre as questões a serem representadas no palco e ampliar o raio de atuação do artista negro. Nesse sistema, o ator é transformado em co-criador tanto do texto quanto do espetáculo, seja quando contribui para a dramaturgia por meio das improvisações, seja quando colabora com ideias relacionadas à cena ou com a execução do próprio espetáculo (assumindo funções técnicas). As funções artísticas (diretor, dramaturgo, concepção cênica, figurinista) são preservadas e os responsáveis por cada setor têm a autonomia necessária para costurar as contribuições surgidas na sala de ensaio, a fim de conferir harmonia ao trabalho coletivo.
A estreia do Bando ocorreu em 1991 com o espetáculo Essa é nossa praia. A peça trata do cotidiano da cidade e se vale de figuras típicas da região do Pelourinho numa mistura inusitada de riso e denúncia social. O formato deu certo e agradou ao público local que se viu representado no tema, na estética do espetáculo, na performance do ator – e, por que não dizer, também na identidade racial dos artistas envolvidos, uma vez que ainda não era tão comum a existência de companhias negras atuando nas áreas centrais da cidade. O sucesso da estreia e a riqueza temática do Pelourinho levou o Bando a criar outros dois espetáculos ambientados na comunidade do Maciel. Trata-se de Ó paí O! (de 1992) e Bai Bai, Pelô! (de 1994), peças nas quais alguns personagens do primeiro espetáculo reaparecem e dialogam com novas figuras em novos contextos – debatendo inclusive os efeitos das transformações da paisagem soteropolitana devido à reforma do centro histórico.
Ainda em 1991, o coletivo produziu O novo mundo e inaugurou outra modalidade de espetáculo com ênfase na dança e nas tradições do candomblé. Algo semelhante foi tentado anos depois com Áfricas (espetáculo infanto-juvenil calcado na mitologia africana), de 2007, Bença (peça que evoca a ancestralidade negra e a memória dos mais velhos em uma composição típica de vanguarda), de 2010, e Dô (onde a performance afro ganha o centro das atenções embalada pela dança japonesa Butoh de Tadashi Endo), de 2015.
http://www.letras.ufmg.br/literafro/teatro/grupos/1101-bando-de-teatro-olodum
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